sábado, 11 de setembro de 2010

Epilepsia

Tenho tentado entender um pouco mais sobre crises de epilepsia. A seguir mostro uma entrevista  com Dr LiLi Min, médico, professor de Neurologia na UNICAMP (SP) que coordena a seção brasileira de um projeto mundial chamado epilepsia Fora das Sombras

Drauzio – O que é a epilepsia 
Li Li Min – Epilepsia é um sintoma que ocorre quando, por algum motivo, o cérebro não está bem e um grupamento de células cerebrais se comporta de maneira hiperexcitável o que pode gerar manifestações clínicas, ou seja, as crises epiléticas.


Drauzio – Como se faz o diagnóstico de epilepsia?
Li Li Min – Para fazer o diagnóstico, é preciso que haja recorrência espontânea das crises. Uma crise única não é indicativa da síndrome. Têm que ocorrer mais de um episódio com intervalo entre eles de no mínimo 24 horas para caracterizar a epilepsia.
Além disso, é preciso que não exista nenhum fator precipitante, seja tóxico, porque a pessoa usa drogas, seja recreativo, como muitas vezes acontece com as bebidas alcoólicas.
Drauzio – Qual a droga que provoca mais convulsões?
Li Li Min – São várias as drogas que podem causar crises epiléticas, que não configuram a epilepsia, porém. Cocaína e ecstasy estão entre elas.
Drauzio – Você disse que a epilepsia é um sintoma. Você poderia explicar por quê?
Li Li Min – A epilepsia é um sintoma comum a várias doenças. Na verdade, é uma síndrome, ou seja, um conjunto de sinais e sintomas que caracterizam uma certa condição.
Epilepsia não tem causa específica. São várias as causas que podem levar à recorrência das crises. Na população infantil, a febre é uma delas. Crianças com febre podem ter convulsão, fenômeno conhecido como convulsão febril que não é característico da epilepsia. Por isso, a medicação é indicada para controlar a temperatura e não as crises convulsivas.


Drauzio – Você disse que as crises de epilepsia surgem por mau funcionamento de certas áreas do cérebro. Como cada área está relacionada com determinada função, uma manifestação epilética pode ser diferente da outra. Qual o tipo mais freqüente de crise epilética?
Li Li Min - A manifestação clínica depende da região cerebral acometida. A mais comum é a crise tônico-clônica ou convulsão, que envolve o cérebro como um todo, a pessoa fica rígida, cai no chão e começa a debater-se. Pode-se dizer que 50% das crises epiléticas são do tipo tônico-clônicas. Os outros 50% são bastante variáveis. Algumas pessoas sentem um formigamento no braço seguido por pequenos abalos porque a região do cérebro afetada comanda as sensações e o movimento desse braço. Outras sentem cheiros estranhos por poucos segundos e saem do ar, isto é, deixam de interagir com o meio. Esse tipo é conhecido como crise parcial complexa e implica turvação da consciência.
Aos olhos dos leigos e das pessoas menos avisadas, tais sintomas acabam se confundindo com problemas psiquiátricos, de loucura. Imagine uma pessoa que tem uma crise dessas, sai do ar, fica inconsciente, mas continua em pé, mexendo nas coisas como se fosse um robô. Por causa disso, muitos pacientes são encaminhados indevidamente para institutos psiquiátricos como se fossem loucos.
Drauzio – Que outros tipos de epilepsia vala a pena citar?
Li Li Min – Outra forma de epilepsia ocorre principalmente na população infantil que apresenta crises de ausência, episódios de liga-desliga. A queixa mais freqüente é o mau aproveitamento escolar e os professores menos avisados acham que a criança tem um déficit cognitivo, no que estão absolutamente enganados. Na verdade, ela está tendo várias crises de ausência por dia, às vezes mais de cem, com poucos minutos de duração e sem a menor consciência do que se passa com ela.
Drauzio – Essas crises de ausência podem aparecer também na vida adulta?
Li Li Min – São menos freqüentes. Em geral, esse tipo de crise acomete mais a população pediátrica.
Drauzio – Os abalos musculares que as pessoas sentem de vez em quando, sem nenhuma explicação aparente, podem ter relação com a epilepsia?
Li Li Min – Outro sintoma das crises epiléticas é a mioclonia, que se caracteriza por abalos musculares. Quando a pessoa faz exercícios físicos extenuantes, antes de dormir, pode ter a sensação de que está caindo no vazio e um estremecimento motor. Trata-se de reação fisiológica normal provocada pela exaustão. Porém, ela passa a ser anormal quando as crises mioclônicas acontecem com certa freqüência, mais no período da manhã A pessoa acorda, vai tomar café e derruba a xícara ou deixa cair a escova de dente, e tudo fica por conta de seu desajeitamento ou desatenção. Crises de ausência como essas podem ocorrer isoladas ou associadas a crises tônico-clônicas, isto é, à convulsão clássica.
Drauzio – Nos adolescentes, muitas vezes isso é confundido com estabanamento próprio da idade….
Li Li Min - A epilepsia mioclônica juvenil é uma síndrome muito comum na adolescência. Em mais ou menos 10% das epilepsias em geral, podemos constatar a seguinte tríade: são crises convulsivas clônicas, associadas à mioclonia, que aparecem na adolescência. Muitas vezes, o médico só é procurado quando a pessoa tem convulsão. Os outros sintomas são negligenciados. No entanto, fazer o diagnóstico da mioclonia juvenil é muito importante, porque existe medicação especifica para controlar esse distúrbio.


Drauzio – Como você colocou bem, os quadros de epilepsia têm apresentação clínica muito variada. No entanto, haveria alguma forma de caracterizar o comportamento médio das crises epiléticas, quanto tempo duram e o que acontece antes e depois delas com o paciente?
Li Li Min – As crises epiléticas são de curta duração. Duram segundos ou alguns minutos no máximo. Vamos tentar dividi-las em dois grandes grupos: as que afetam apenas parte das estruturas cerebrais e as que afetam o cérebro como um todo. Dependendo de sua localização, os sintomas variam bastante.
Uma crise comum é provocada pela epilepsia que se manifesta na região lobo-temporal do cérebro. A pessoa sente mal-estar, desconforto na barriga que sobe até a garganta, medo ou sensação de déjà vu. Tem a nítida sensação de conhecer um lugar em que nunca esteve ou de já ter vivido aquela situação do momento. Ou ao contrário: entra em casa e parece não reconhecer o ambiente. Conforme a crise evolui, pode haver alteração da consciência. O paciente fica parado por alguns segundos, com os olhos vidrados, ou faz alguns gestos, mexe com a mão, com a boca, começa a mastigar ou a tirar a roupa. São movimentos automáticos - por isso o fenômeno se chama automatismo - que podem evoluir para a convulsão propriamente dita, a pessoa cai no chão e se debate.
DrauzioNesses casos de epilepsia, nem sempre a pessoa evolui para a convulsão?
Li Li Min – A pessoa pode apresentar somente uma dessas fases e ter uma crise parcial simples. Não perde a consciência, mas tem o mal-estar epigástrico, a sensação de déjà vu e de medo sem razão aparente.
Drauzio – Imagino como deve ser a vida dessas pessoas. Sentem uma coisa estranha no abdômen que sobe para a garganta, acham que conhecem um lugar no qual nunca estiveram, mexem as mãos ou tiram a roupa sem ter consciência do que estão fazendo. Daí, a serem encaminhadas para um psiquiatra é um passo muito curto.
Li Li Min – A associação entre problemas psiquiátricos e psicológicos e esse tipo de crise é muito freqüente. Nos casos mais severos, é muito comum o paciente necessitar de acompanhamento psiquiátrico além dos cuidados médico-clínicos, o que ajuda a cercar de preconceitos a epilepsia.
De qualquer modo, dá para imaginar a situação constrangedora por que passa a pessoa que tem uma crise num shopping center (as crises são totalmente imprevisíveis), desperta sem ter consciência do que realmente aconteceu e se vê rodeada por gente estranha. Embora seja um problema físico, por incompreensão da sociedade ou por falsas crenças que se perpetuam, essas pessoas acabam marginalizadas, excluídas do convívio social.


Objetivo da campanha Epilepsia fora da sombra







A síndrome epilética não é um fenômeno recente. É tão antiga quanto a humanidade, mas ainda é vista como um mal demoníaco, espiritual. A carga de preconceito estigmatizante que acompanha as pessoas com epilepsia tem-se perpetuado através da história.
O objetivo da campanha Epilepsia Fora das Sombras é prover tratamento adequado para os pacientes, principalmente nos países em desenvolvimento como o Brasil, onde parcela significativa não está sendo tratada. Pesquisa recente realizada nas cidades de São Paulo, Campinas e São José do Rio Preto mostrou que o tratamento é inadequado em mais ou menos metade dos casos. Se ele fosse bem orientado, muitas pessoas estariam livres das crises e engajadas numa atividade social laboriosa, o que lhes permitiria gozar melhor qualidade de vida. A esses pacientes, porém, está reservada apenas a exclusão social.
No nosso país, a campanha visa à formulação de um modelo de atendimento integral aos pacientes com epilepsia, não só em termos de ajudar a elaborar uma política nacional de saúde, mas também para conscientizar que a epilepsia não é contagiosa, nem um problema espiritual e que as pessoas podem ficar livres das crises com medicação.
Sempre costumo perguntar o que vem à mente quando alguém pensa em epilepsia. Com certeza não é Alfred Nobel, Dostoievski, Machado de Assis, Júlio César, Flaubert, Alexandre, o Grande. Todas essas pessoas tiveram crises epiléticas. D. Pedro I, o imperador do Brasil, tinha epilepsia, mas a síndrome continua sendo vista como problema demoníaco, de sanidade mental, apesar de as pessoas poderem levar vida normal desde que as crises sejam controladas.


4 comentários:

  1. Obrigado por ter lido meu artigo no sabe tudo,quero tambem te dar os parabens pelo blog gostei muito dos assuntos que voce aborda,conheça tambem o meu blog...até...

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  2. Olá, só hoje vi seu comentário aqui, ainda não tinha tomado conhecimento que estava aqui. Desculpe. visitei seu blog e adorei. Obrigada pela visita. abços

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  3. Respostas
    1. Obrigada Mariana. Há muito tempo não entro no meu blog, vou começar a olha-lo com mais carinho. Obrigada pelo comentário. abraço

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